O Ministro Alexandre de Moraes citou em seu relatório que a conclusão do Ministério da
Defesa é a mesma a que chegaram diversas instituições fiscalizadoras: não houve fraude no
processo eleitoral
O mistério, com objetivos políticos, sobre o relatório de técnicos do Ministério da Defesa a
respeito das urnas eletrônicas apenas explicita o retrocesso democrático que vivemos nestes
últimos quatro anos, que precisa ser estancado. Em tempos normais, os militares não teriam
sido chamados para auditá-las, tarefa que sempre foi delegada a universidades e institutos
tecnológicos, além de aos próprios partidos políticos, que usavam seus especialistas para
atestar a higidez do sistema.
Depois de mais de 25 anos de uso, nunca houve comprovação de fraude no sistema, invejado
por vários países que, como os Estados Unidos, ainda usam o voto impresso em muitos
estados. No Brasil, temos exemplos das trapaças mais diversas no tempo do voto impresso,
que ficou caracterizado como um sistema falho e suscetível a fraudes, sucessor do “voto a bico
de pena” da República Velha.
O (ainda) presidente Jair Bolsonaro levou quase dois dias para falar sobre o resultado da
eleição, tendo admitido a derrota apenas implicitamente, após agradecer os mais de 58
milhões de votos que obteve. Enquanto isso, empresários ligados a esquemas golpistas
interrompiam as estradas do país, numa evidente tentativa de tumultuar. Como não deu certo,
e o bloqueio das estradas prejudicou a população, o presidente Bolsonaro teve de pedir que
seus apoiadores desobstruíssem as rodovias e voltou à mudez à espera do tal relatório, que
saiu ontem.
A montanha pariu um rato, e, como fizera com Bolsonaro, o presidente do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, foi rápido no gatilho. Divulgou uma nota oficial
em que reduz o relatório ao essencial: ele reconhece que não houve fraude no processo
eleitoral, nem inconsistências. Moraes citou ainda que a conclusão do Ministério da Defesa é a
mesma a que chegaram diversas instituições fiscalizadoras.
Nunca uma eleição foi tão acompanhada, justamente pelas ressalvas feitas pelo próprio
presidente Bolsonaro, eleito nos últimos 24 anos pelo mesmo sistema que agora tenta
desacreditar.O ministro Alexandre de Moraes sublinhou em sua nota oficial que várias outras
instituições chegaram à mesma conclusão dos técnicos militares, mas não as citou.
O TSE convidou 16 missões de observação eleitoral, oito internacionais e oito nacionais. Ao
todo, mais de 500 observadores participaram do processo eleitoral brasileiro, com
independência e total acesso às instalações, sistemas eletrônicos e locais de votação. Além do
Tribunal de Contas da União (TCU) e da OAB nacional, que afirmaram em relatórios próprios
que a eleição transcorreu em normalidade e sem problemas com as urnas eletrônicas, várias
outras instituições participaram da fiscalização. Em 30 de outubro, as missões nacionais
divulgaram comunicado conjunto com as seguintes mensagens:
1) Expressar o pleno reconhecimento da validade dos resultados divulgados pelo TSE;
2) Reafirmar a confiança na integridade do processo eleitoral brasileiro, em todas as suas
etapas, conduzido de forma transparente, democrática e competente pelo TSE e por todas as
forças sociais que colaboraram para a sua realização;
3) Reiterar a credibilidade nas urnas eletrônicas e no sistema eletrônico de votação, por sua
segurança, alto grau de desenvolvimento tecnológico, transparência e auditabilidade;
4) Celebrar a democracia brasileira que, na noite de hoje, dá mais um passo significativo em
sua história de fortalecimento e consolidação no cenário das democracias mundiais.”
Entre elas estavam a Universidade de São Paulo (USP), a Transparência Eleitoral Brasil; o
Núcleo de Estudos e Pesquisa em Direito Internacional da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro (Nepedi-Uerj); a Associação Nacional das Defensoras e dos Defensores Públicos
(Anadep); a Associação Juízes para a Democracia (AJD) e a Faculdade de Direito de Vitória
(FDV), que também atestaram a lisura do pleito. O entendimento geral foi que, “após a
realização de ampla missão de observação, que se iniciou meses antes das eleições”, em
termos conclusivos “de uma forma geral, as autoridades, os candidatos e candidatas e a
cidadania cumpriram as normas eleitorais vigentes no Brasil e garantiram que o segundo turno
das Eleições Gerais de 2022 transcorresse democraticamente com tranquilidade, transparência
e normalidade, tornando o resultado final apurado definitivo”.
Merval Pereira, jornalista
Fonte: https://oglobo.globo.com